Considerações sobre o projeto de lei 4.253/20 da nova lei geral de licitação

O projeto de lei (4.253/20) da nova lei geral de licitações

     No dia 10 de dezembro o Senado aprovou o PL 4.253/2020, cuja redação estabelece o regulamento que substituirá a Lei de licitação 8.666/93, a do pregão 10.520/00, além de revogar dispositivos da Lei nº 12.462/11 (lei do RDC – Regime Diferenciado de Contratações). Vejamos, neste artigo, as principais mudanças presentes no projeto de lei.

     No artigo 7º, há previsão de designação de agentes público para o desempenho das funções descritas na nova lei, que tenham os seguintes requisitos: sejam, preferencialmente, servidor efetivo ou empregado público dos quadros permanentes da Administração Pública, tenham atribuições relacionadas a licitações e contratos ou possuam formação compatível ou qualificação atestada por certificação profissional e não sejam cônjuge ou companheiro de licitantes ou contratados habituais da Administração nem tenham com eles vínculo de parentesco. Destaque-se, aqui, a preocupação com a atribuição que esse agente desempenhe, no sentido de que tenha alguma relação com as atividades ligadas às licitações e contratos.

     No artigo 12, que trata do que deve ser observado no processo licitatório, no inciso III, entendo importante a previsão em relação ao fato de que o desatendimento de exigências meramente formais que não comprometam a aferição da qualificação do licitante ou a compreensão do conteúdo de sua proposta não importará o afastamento da licitação e nem a invalidação do processo. Isso trará mais segurança aos membros de comissão de licitação e pregoeiros na hora da análise da documentação. Referido artigo também menciona outras importantes e pontuais situações quanto ao momento da sessão.

     O artigo 17 apresenta as fases da licitação com apresentação de propostas e lances (inciso III) anterior à habilitação (inciso V), que poderá anteceder à proposta se houver motivo devidamente fundamentado e a preferência por realização das licitações na forma eletrônica, sendo a forma presencial aceita apenas se motivada e, ainda, com a sessão gravada em áudio e vídeo (artigo 2º).

     De interessante previsão, o artigo 20 indica que os itens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da Administração Pública deverão ser de qualidade comum, não superior à mínima necessária para cumprir as finalidades às quais se destinam, vedada a aquisição de artigos de luxo, sendo que os três poderes definirão, em regulamento, o que são as categorias comum e luxo.

     O artigo 24, como já estabelecido no Decreto 10.024/19, do pregão eletrônico, autoriza que o orçamento estimado da contratação tenha caráter sigiloso, excetuando-se a hipótese de julgamento por maior desconto.

     O § 9º do artigo 25 (que trata do edital), prevê a possibilidade de o edital exigir que o contratado destine um percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da contratação a mulher vítima de violência doméstica e a oriundo ou egresso do sistema prisional, na forma estabelecida em regulamento.

     Quanto às modalidades de licitação, verifica-se a supressão do Convite e da Tomada de Preços, sendo que o artigo 28 prevê as seguintes: pregão, concorrência, concurso e a grande novidade, o diálogo competitivo, cujo conceito menciona ser a modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos.

     O diálogo competitivo fica restrito às contratações em que a Administração contrate objetos que envolvam as seguintes condições: inovação tecnológica ou técnica, impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado e impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração, além da impossibilidade de os modos de disputa aberto e fechado atenderem ao caso concreto (artigo 32).

     Em relação aos tipos de julgamento, foram acrescentados aos existentes na Lei 8.666/93, os critérios de maior desconto e maior retorno econômico (utilizado exclusivamente para a celebração de contrato de eficiência).

     No tocante às compras, o artigo 40 enfatiza o que já é de conhecimento, mas que, infelizmente, não se pratica nos órgãos públicos, ocasionando contratações fora do que determina a lei, com constantes fragmentações indevidas de despesa. Referido artigo assim estabelece: “o planejamento de compras deverá considerar a expectativa de consumo anual…”.

     Outra previsão de grande importância foi a prevista no inciso III, do artigo 41, que permite à Administração vedar a contratação de marca ou produto, quando, mediante processo administrativo, restar comprovado que produtos adquiridos e utilizados anteriormente não atendem a requisitos indispensáveis ao pleno adimplemento da obrigação contratual. No caso, é bom observar que é necessário que a justificativa da não aceitação esteja devidamente comprovada em um prévio processo administrativo.

     Quanto ao regime de execução, a novidade fica a cargo de três hipóteses novas, sendo elas: contratação integrada (em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básico e executivo), contratação semi-integrada (em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver o projeto executivo) e fornecimento e prestação de serviço associado (em que o contratado, além do fornecimento do objeto, responsabiliza-se por sua operação, manutenção ou ambas, por tempo determinado).

     Em relação à análise do edital pelo jurídico, foi interessante e importante a previsão de como deve ser a redação do parecer, que deve conter os seguintes requisitos: apreciar o processo licitatório conforme critérios objetivos prévios de atribuição de prioridade; redigir sua manifestação em linguagem simples e compreensível e de forma clara e objetiva; dar especial atenção à conclusão, que deverá ser apartada da fundamentação, ter uniformidade com os seus entendimentos prévios, ser apresentada em tópicos, com orientações específicas para cada recomendação e, se constatada ilegalidade, apresentar posicionamento conclusivo quanto à impossibilidade de continuidade da contratação nos termos analisados, com sugestão de medidas que possam ser adotadas para adequá-la à legislação aplicável (artigo 52, § 1º, I, II, III).

     O § 2º do artigo 54 autoriza que o prazo de apresentação das propostas e lances possam, mediante decisão fundamentada, ser reduzidos até a metade nas licitações realizadas pelo Ministério da Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

     Já o artigo 55, apresenta os modos de disputa aberto, hipótese em que os licitantes apresentarão suas propostas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes e fechado, hipótese em que as propostas permanecerão em sigilo até a data e hora designadas para sua divulgação. Informa, ainda, que podem ser utilizados de forma isolada ou conjuntamente.

     No caso da habilitação, o artigo 62, III, informa que os documentos relativos à regularidade fiscal, em qualquer caso, somente serão exigidos em momento posterior ao julgamento das propostas, e apenas do licitante mais bem classificado e quanto à vistoria, reforça o entendimento que já prevalece no sentido de que ela pode ser substituída por uma declaração formal, ou seja, não pode ser considerada como obrigatória.

     Também, no caso de serviços contínuos, o edital poderá exigir certidão ou atestado que demonstre que o licitante tenha executado serviços similares ao objeto da licitação, em períodos sucessivos ou não, por um prazo mínimo, que não poderá ser superior a 3 (três) anos (artigo 66, § 5º).

     O artigo 71 estabelece os documentos que devem compor o processo de contratação direta (inexigibilidade e dispensa de licitação), sendo eles: o documento de formalização da demanda, estudo preliminar, se for o caso, estimativa de despesa, parecer jurídico e técnico, se for o caso, preenchimento dos requisitos mínimos de habilitação e qualificação, razão da escolha do contratado, justificativa de preço e autorização da autoridade competente.

     Quanto às hipóteses de dispensa, a novidade fica a cargo da possibilidade de contratar serviços de manutenção de veículos automotores quando envolver valores inferiores a 100 mil reais e a preferência pela divulgação em sítio eletrônico oficial, pelo prazo mínimo de 3 dias úteis, de aviso com a especificação do objeto pretendido e com a manifestação de interesse da Administração em obter propostas adicionais de eventuais interessados, devendo ser selecionada a proposta mais vantajosa, nos casos de dispensa por valor e pagamento preferencialmente por meio de cartão de pagamento (artigo 74, incisos I e II e parágrafos 3º e 4º).

      O artigo 77, apresenta os procedimentos auxiliares das licitações e das contratações sendo eles: credenciamento, pré-qualificação, procedimento de manifestação de interesse, sistema de registro de preços e registro cadastral, cujos critérios claros e objetivos de aplicação devem constar em regulamento. Abrindo-se um parêntese para o procedimento de manifestação de interesse (PMI), ressalte-se que ele, não obstante já exista, não é muito comum a sua utilização, ainda que seja um importante instrumento à disposição da Administração. Percebe-se que, no âmbito municipal, existem poucos decretos que regulamentam a sua utilização. Espera-se que com a nova lei ele possa a ser melhor aproveitado.

     Ainda quanto aos procedimentos auxiliares o artigo 83 menciona que o prazo de vigência da ata de registro de preços será de 1 ano e poderá ser prorrogado, por igual período, desde que comprovado o preço vantajoso. Atualmente, de acordo com o Decreto 7.892/13 que regulamenta o registro de preços no âmbito federal, só autoriza que a ata dure por no máximo 1 ano, sem prorrogação além desse prazo.

     Outra novidade quanto ao registro de preços é a possibilidade de a administração federal exigir a adesão de órgãos estaduais, municipais e distritais à sua ata, sempre que for caso de transferência voluntária da União e, nesse caso, não se observa o limite máximo de 50% do quantitativo e máximo do dobro por grupo de solicitantes. Esse limite pode ser ultrapassado, também, no caso de adesão, para aquisição emergencial de medicamentos à ata do Ministério da Saúde pelos entes da federação (artigo 85, §§ 6º e 7º).

     O artigo 86 prevê a criação de um sistema de registro cadastral unificado disponível no Portal Nacional de Contratações Públicas, para efeito de cadastro unificado de licitantes, na forma disposta em regulamento e que deve ser utilizado pelos órgãos e entidades da Administração Pública. Esse cadastro deve ser amplamente divulgado e estar permanentemente aberto aos interessados, com chamamento, no mínimo anual, para atualização e ingresso de novos interessados.

     No capítulo reservado à formalização dos contratos, no artigo 90, § 4º, estabelece-se que, antes de formalizar ou prorrogar o prazo de vigência do contrato, a Administração deverá verificar a regularidade fiscal do contratado, consultar o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS) e o Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), emitir as certidões negativas de inidoneidade, de impedimento e de débitos trabalhistas e juntá-las ao respectivo processo.

     Já no artigo 90, dentre as cláusulas necessárias, a ênfase fica para a necessidade de haver cláusulas que indiquem o prazo para resposta ao pedido de repactuação de preços, quando for o caso e o prazo para resposta ao pedido de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, quando for o caso, tendo em vista que no regramento atual não existe essa previsão e o artigo 93 menciona que a divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) é condição indispensável para a eficácia do contrato e seus aditamentos.

     Outra interessante previsão em relação aos contratos é a possibilidade de o edital exigir, no caso de obras e serviços de engenharia, a prestação da garantia na modalidade seguro-garantia e prever a obrigação de a seguradora, em caso de inadimplemento pelo contratado, assumir a execução e concluir o objeto do contrato, hipótese em que a seguradora deverá firmar o contrato, inclusive os aditivos, como interveniente anuente (artigo 101).

     Além disso, também estabelece no artigo 105 a possibilidade de a Administração celebrar contratos com prazo de até 5 anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos e, no caso de serviços, prorrogá-los por até 10 anos e a prorrogação automática no caso de contrato por escopo, cujo objeto não for concluído no prazo estabelecido (artigo 110).

     O § 2º do artigo 120, retrata o já disposto na Súmula 331 do TST quando indica que, exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, a Administração responderá solidariamente pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado.

     No tocante aos pagamentos, no artigo 140 há previsão de que se deve observar a ordem cronológica para cada fonte diferenciada de recursos, subdividida pelas seguintes categorias de contratos: fornecimento de bens, locações,  prestação de serviços e realização de obras.

      O artigo 150 prevê que nas contratações regidas pela nova Lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.

     Diante do exposto, percebe-se que são pontuais e importantes as principais alterações presentes no projeto da futura nova lei de licitação. Quando publicada, os entes da federação poderão, pelo prazo de 02 anos, utilizarem os regramentos da lei 8.666/93 ou da nova lei, vedando-se que façam a mistura de previsões nelas contidas para uma determinada contratação, ou seja, deve-se utilizar uma ou outra.

     Esperemos que ela seja logo sancionada e que quando publicada seja aplicada pelos entes da Administração Pública tendo em vista suas peculiaridades benéficas às contratações e o longo tempo que se passou até que o projeto estivesse no patamar em que se encontra. Estaremos na torcida!

     Já conhece nossa plataforma? Clique aqui e faça um teste por 10 dias sem compromisso.

 

 


Gislany Gomes Ferreira
OAB 186.553

Compartilhe:

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp

Categorias

Categorias

Receba nosso conteúdo exclusivo por e-mail

Acompanhe nossas últimas atualizações